Como promover uma utilização saudável da tecnologia nos jovens?

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Como promover uma utilização saudável da tecnologia nos jovens?

Se pensarmos numa criança ou adolescente de hoje, o mais provável é que as suas atividades preferidas sejam ver vídeos no YouTube, jogar jogos online ou ver séries em plataformas de streaming. É provável que também gostem de passar algumas horas nas redes à procura do filtro perfeito ou no Twitch a ouvirem dicas dos seus gamers favoritos. A verdade é que os mais novos vivem, tal como os adultos, permanentemente ligados e rodeados de ecrãs e vários estudos confirmam a tendência.

Dados de 2019 do projeto EU Kids Online Portugal, que se dedica ao estudo da relação das crianças e adolescentes (9 – 17 anos) com a internet, mostram que 80% das crianças inquiridas “usam a internet todos os dias para ouvir música e ver vídeos”, enquanto que “75% usam-na para comunicar com familiares e amigos ou para ir a redes sociais”. O estudo afirma ainda que “em média, as crianças e jovens portugueses estimam passar cerca de 3 horas por dia na internet”.

Outro estudo da Entidade Reguladora da Comunicação Social, dedicado à análise dos usos de meios eletrónicos por crianças entre os 3 e 8 anos em Portugal, mostra que a televisão continua a ser o meio dominante e todas as crianças têm acesso aos seus conteúdos, sobretudo a desenhos animados. Já um estudo de 2016 do Centro de Estudos de Comunicação e Cultura da Universidade Católica Portuguesa, indica que o tablet é o dispositivo favorito das crianças com menos de 8 anos, que o utilizam maioritariamente para jogar e ver desenhos animados.

Independentemente das conclusões dos estudos que têm vindo a ser desenvolvidos neste âmbito, há uma tendência clara e unânime: o confinamento dos últimos meses fez com que smartphones, tablets e computadores se tornassem ainda mais imprescindíveis.

Embora a utilização da tecnologia apresente inúmeras vantagens, da promoção da criatividade ao combate ao isolamento social, é importante que o seu uso seja moderado e equilibrado, com supervisão dos pais e educadores. Esta supervisão deverá acontecem em duas vertentes, tanto ao nível do tempo de utilização do dispositivo como ao nível do tipo de atividades realizadas.

De seguida apresentamos algumas dicas e boas práticas que têm como objetivo ajudar na promoção de uma utilização mais “saudável” da tecnologia. Importa realçar que, quer sejamos ou não adeptos da tecnologia, é inegável que esta é parte integrante do mundo atual e é um meio que traz também inúmeras vantagens e potencialidades. Por essa razão, não devem ser impostos limites excessivamente restritivos nem veicular a mensagem de que a tecnologia é “má” ou prejudicial. Em vez disso, devemos pois focar-nos em ensinar hábitos saudáveis que permanecerão com as gerações mais novas ao longo da sua vida (digital). Eis alguns exemplos:

 

  • Diálogo constante

Sofia Ramalho, vice-presidente da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), defende que “uma das boas práticas que pode ser adotada pelas família é o diálogo constante”. Incentiva-se a que famílias com crianças até aos 13 ou 14 anos se sentem para conversar uma vez por semana sobre os consumos digitais que fizeram — o que publicaram, o que pesquisaram, o que viram, o que jogaram. Desta forma, abre-se espaço para abordar outras temáticas como a privacidade, o cyberbullying e outros perigos digitais, num ambiente seguro e de partilha, sem autoritarismo nem proibições.

Nestas conversas deve explicar-se ainda por que não devem descarregar programas desconhecidos, clicar em ligações suspeitas ou partilhar informações pessoais em aplicações ou sites desconhecidos. É importante que se explique que nunca devem responder a mensagens não solicitadas de estranhos — e, caso as recebam, isso deverá ser imediatamente reportado.

 

  • Monitorizar

A vice-presidente da OPP indica que, quando falamos de redes sociais, os cuidados devem ser redobrados e defende que, “até por volta dos 15 anos, os conteúdos e as ‘amizades virtuais’ devem ser monitorizados de perto por parte dos pais, de forma a criar bases e bom senso quanto à sua utilização”. Claro que com crianças mais novas isto é mais fácil de fazer, já que à medida que crescem, fica mais difícil de acompanhar o que fazem online. Por isso mesmo, é importante que, de tempos a tempos, os pais explorem os dispositivos dos filhos de todas as idades, para ver se existe softwares ou aplicações prejudiciais instalados, garantindo também que o controlo de acesso a conteúdo inapropriado está ativo. Os adultos devem ainda conhecer os amigos dos filhos, virtuais e não só, e saber ao certo que plataformas, programas ou sites frequentam e utilizam.

  • Limitação Horária

É importante estabelecer um conjunto de regras mas é ainda mais importante que isto seja feito em conjunto, envolvendo as crianças e os adolescentes na decisão e pedindo-lhes sugestões. O ideal é que seja estabelecido um mapa semanal familiar da utilização da tecnologia, onde cada membro defina quantas horas vai gastar com a tecnologia, seja a jogar no tablet, a fazer scroll nas redes ou a ver séries na televisão. Durante a semana, o ideal é que a tecnologia como entretenimento fique reservada para depois dos trabalhos de casa. E é ótimo se este mapa semanal incluir uma noite dedicada a uma sessão de cinema em família!

Em relação ao tempo, cada família deverá definir o que acha mais sensato mas as diretriz mais recentes da Academia Americana de Pediatras apotam que as crianças entre os 5 e os 18 anos deveriam passar não mais do que 2 horas em frente a ecrãs, enquanto que crianças com menos de 2 anos não deveriam ser sequer expostas a estes dispositivos. Mas num mundo dominado por tablets, smarthphones e computadores, parecem metas desafiantes… No entanto, esta instituição apresenta algumas diretrizes mais gerais que podem ajudar na conceção deste plano de tempo de ecrãs:

  • Até aos 18 meses, a utilização de ecrãs deve ser apenas para videochamadas na presença de um adulto (por exemplo, com um avô que está longe);
  • Dos 18 aos 24 meses (2 anos), o tempo de ecrã deve ser reservado apenas ao visionamento de programas educacionais na presença de um pai ou educador;
  • Entre os 2 e os 5 anos, o tempo de ecrã não-educacional deve ser limitado a 1 hora nos dias úteis e 3 horas ao fim de semana;
  • Em crianças com 6 ou mais anos, devem ser encorajados hábitos tecnológicos saudáveis e devem ser limitadas as atividades que envolvem ecrãs;

 

Claro que podem existir exceções e estes limites horários podem ser flexíveis — se os mais novos estiverem a utilizar o computador para um trabalho escolar ou utilizarem o tablet para ouvir música enquanto leem, por exemplo, este tempo não deve ser considerado como “tempo de ecrã” e não deverá contar para o limite diário. Como em tudo o resto, o bom senso é mais importante do que seguir à risca uma soma horária.

Outro ponto importante é que a luz emitida pelos ecrãs inibe a produção de melatonina e o excesso de exposição afeta o sono dos mais novos, como avisa Filipa Sommerfeldt Fernandes, especialista em sono infantil. Um estudo norte-americano que se dedicou a analisar o uso de dispositivos eletrónicos em crianças dos 8 aos 17 anos, concluiu que a utilização destes perto da hora de ir para a cama reduz efetivamente a quantidade e a qualidade do sono. Assim, a utilização da tecnologia deve ser evitada entre 30 a 60 minutos antes de ir dormir e pode até ser criado um ritual de “desligamento” que estabeleça como rotina diária esta despedida da tecnologia: depois de guardados e desligados todos os dispositivos, pode ser criado um momento entre todos membros da família em que desejam “boa noite” ou em que lavam os dentes em conjunto, por exemplo.

 

  • Definir Espaços de Utilização

Para assegurar que o uso da tecnologia é equilibrado e não constante, podem ser definidos espaços em casa onde a utilização de dispositivos eletrónicos é vedada. A mesa de refeições ou a cama são dois bons exemplos, incentivando a que se façam outras atividades nestas zonas — relatar como foi o nosso dia durante o jantar e ler antes de dormir são duas ótimas sugestões.

Outro ponto importante é a promoção da comunicação verbal, limitando a troca de mensagens entre membros da família quando estão todos em casa. Deve sempre apostar-se na verbalização e no diálogo “em carne e osso”, mesmo que para pequenos recados ou pedidos de uma divisão para a outra.

 

  • Organizar Momentos Offline

Esta dica é especialmente boa para toda a família, já que implica que todos os membros ficam proibidos de aceder à tecnologia, sejam adultos ou crianças. Seja uma tarde, uma hora ou um dia inteiro, o que importa é organizar eventos semanais onde as tecnologias são barradas e onde o convívio familiar é promovido. E existem inúmeras atividades que podem ser feitas e que vão certamente agradar a miúdos e graúdos: jogar jogos de tabuleiro, fazer bolos, começar uma pequena horta, dar início a pequenos projetos de bricolage ou fazer caminhadas são bons exemplos de práticas que barram a tecnologia e promovem relações familiares.

 

  • Utilização Coletiva 

É importante lembrar que o tempo que as crianças e adolescentes passam em frente ao ecrã não tem de ser tempo em que estão sozinhos. Por isso mesmo, os pais podem aproveitar para brincar e interagir com os filhos nestas alturas, de forma a incentivar as interações sociais, a ligação familiar e até a aprendizagem. Os adultos podem aprender a jogar na consola para fazer campeonatos caseiros e falar sobre desportivismo ou podem ver filmes em família e debater experiências de vida e visões sobre os mais diversos assuntos. É importante que as crianças não sejam apenas monitorizadas quando estão a interagir com a tecnologia — importa mais que os adultos interajam com eles para entenderem o que de facto estão a fazer e como podem ser parte dessa exploração tecnológica por parte dos mais novos.

A tecnologia e os dispositivos digitais são parte integrante do mundo de hoje. Os benefícios de smartphones, tablets e computadores, se usados de forma moderada e adequada, são inúmeros. Mas é importante não esquecer que o tempo “cara a cara” com a família, amigos e professores desempenha um papel fundamental e ainda mais importante na promoção da aprendizagem das crianças e num desenvolvimento saudável. O ideal será equilibrar estes dois mundos para criarmos uma geração tão habilidosamente tecnológica quanto admiravelmente humana!

 

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